Poucos conhecem, mas Poços de Caldas tem um pequeno paraíso responsável pela proteção de animais silvestres. Parte deles já não é mais encontrada na fauna e a reprodução em cativeiro é o que resta de esperança para a preservação das espécies.
Este pequeno paraíso existe há mais de 20 anos no bairro Bortolan e recebeu o nome de Criadouro Poços de Caldas. Ao total, abriga mais de 4 mil aves originárias de todas as partes do planeta. São mais de 300 espécies diferentes. Há todos os tipos, cores e tamanhos. Algumas vivem livremente e já estão habituadas ao contato direto com o homem. Estão sempre andando de lá pra cá, espiando, curiosas.
Em cada cantinho do imenso lugar é possível perceber os diferentes trinados, que encantam pelos timbres e tons distintos que ecoam pelos corredores habitados. Espaço que foi totalmente readequado para receber estes animais e fazê-los se sentirem o mais próximo possível de onde nunca deveriam ter saído: seu habitat. Infelizmente, esta é apenas uma das consequências do tráfico de animais.
Quem conta melhor esta história é Alexandre Paulo Rezende Neto Armando, veterinário do viveiro. Ele diz que o criadouro vem sendo constantemente construído há mais de duas décadas. Começou com um sonho do empresário Moacyr Carvalho Dias de criar aves e ter maior contato com estes animais.
“Ele conta que desde criança, sempre tinha aves em casa, e este sonho tomou uma proporção muito grande porque hoje o criadouro de Poços de Caldas se tornou o maior da América do Sul”, afirma o veterinário.
Segundo ele, o criadouro está subdividido em duas áreas: científica e comercial. Tudo isso com a aprovação e requisitos estabelecidos pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
Desta forma, todos os animais que nascem em cativeiro podem ser comercializados para pets, a exemplo do que acontece com araras e papagaios. Contudo, as espécies do criadouro científico são voltadas apenas para trabalhos cujo objetivo é a preservação. Estas, por sua vez, não podem ser comercializadas. Os animais são reproduzidos em cativeiro, o que, segundo o veterinário, é fundamental para a perpetuação de algumas espécies que não são mais encontradas em seus habitats.
O Criadouro Poços de Caldas abriga aves raras e em extinção, a exemplo do mitu mitu, também conhecido como mutum de Alagoas. “O único lugar no mundo que você vai ver este animal vivo é aqui. Isso porque um outro criador retirou os últimos exemplares da natureza para salvar a espécie. De apenas seis exemplares, ele foi se reproduzindo em cativeiro e hoje nós temos perto de 40 animais”, conta.
Recentemente, o viveiro recebeu mais de mil animais, como antas, lhamas, pacas, cotias, esquilos e o Callithrix, também conhecido como mico-estrela. Eles foram doados por um criador que fechou suas portas. “São animais que foram apreendidos pelo Ibama ou pela Polícia Ambiental e que são enviados para os criadouros. Nós somos os fiéis depositários do Ibama”, explica.
De acordo com o veterinário, todas as aves são classificadas. Elas têm uma anilha ou microchip intramuscular, através dos quais é possível levantar todas as informações do animal. Com o número de série é possível saber a origem da ave, em qual viveiro está, entre outros detalhes armazenados em um banco de dados.
Renda
O criadouro é praticamente todo sustentado pelo empresário Moacyr Carvalho Dias. Alexandre classifica como um hobby caro. Prova disso é que a maioria dos criadouros científicos no Brasil está fechando suas portas pelo fato de não conseguir verba suficiente para bancar os altos custos.
No Criadouro Poços de Caldas trabalham cerca de 20 funcionários: 10 tratadores, além de uma equipe de veterinários, tratoristas, serralheiros, pintores, pedreiros e auxiliares. “É uma empresa. Para se ter uma ideia, o maior zoológico da América do Sul é o de São Paulo e lá tem menos animais do que a gente. E não se encontra a estrutura que existe aqui”, garante.
Para minimizar as dificuldades financeiras, foi criada a Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) Ave é vida. A expectativa é que o criadouro comercial seja autossustentável.
Infelizmente, nenhum outro empresário se prontificou a colaborar com a ideia. Portanto, não há doações que colaborem com a vida financeira do criadouro. A esperança é que o cenário seja outro com a criação da Oscip: encontrar parceiros dispostos a apoiar.
“A Oscip tem autonomia de pedir apoio a estes parceiros e às empresas que queiram ajudar. Assim, teremos mais recursos a serem investidos no criadouro científico para bancar pesquisas, ração e toda a estrutura que existe aqui hoje”, diz.
De acordo com Alexandre, hoje acontece um projeto dentro do criadouro com o objetivo de incentivar pesquisas acadêmicas. É realizado em parceria com a Puc Poços, por meio do Departamento de Medicina Veterinária e do Laboratório de Biologia Molecular de Poços de Caldas.
As três entidades se uniram para iniciar pesquisas em prol da preservação. Além disso, mais de 20 trabalhos em parceria com a Puc já foram publicados em veículos especializados na área, tendo como enfoque aves silvestres.
“Temos que publicar trabalhos para manter o título de Criadouro Científico. Por isso, sempre temos obras sendo desenvolvidas aqui e várias entidades como a USP, UFMG mandam seus pesquisadores para coletar material biológico e desenvolverem suas pesquisas próprias”, conta.
De acordo com o Ibama, calcula-se que o tráfico de animais silvestres retire, anualmente, cerca de 12 milhões de espécies de nossas matas; outras estatísticas estimam que o número real esteja em torno de 38 milhões.
O Criadouro Poços de Caldas é um dos viveiros do país que recebe estes animais. Ou melhor, aqueles que sobrevivem e são apreendidos pelo Ibama. Alexandre diz que o tráfico de animais é o terceiro maior mercado ilícito do mundo, perdendo apenas para as drogas e armas.
Por conta da imensa extensão territorial do Brasil, a fiscalização de todas as áreas é muito difícil e mesmo que, com o tempo, a consciência ecológica diminua os números, o combate a esta prática é tarefa árdua.
Com a legalização dos criadouros comerciais, o Ibama trava uma batalha contra o tráfico. Isso porque, a partir de então, pessoas que queiram ter um animal destes em casa poderão tê-los, desde que comprem de um criadouro legalizado, como prevê a lei. Caso contrário, a multa pode chegar a R$ 5 mil por espécie.
Esta medida garante que o animal comercializado nasceu em cativeiro. “Isso é muito importante porque os animais comercializados indevidamente sofrem maus-tratos. A finalidade de quem vende é meramente financeira. Eles quebram as asas das aves, a alimentação é horrível, o animal fica debilitado. A estatística é que, de cada 10 animais retirados desta forma da natureza, apenas um sobrevive. Nove morrem para que alguém tenha um em casa. Os criadouros comerciais vêm para lutar em linha direta contra o tráfico”.
Em contrapartida, animais criados em cativeiro nascem para esta finalidade: servir ao mercado pet, evitar a retirada de animais da natureza e garantir o equilíbrio ecológico.
Desde 1997 os criadouros comerciais são liberados para venda destes bichos reproduzidos em cativeiro. Alexandre ressalta que é proibida a comercialização de animais provindos da natureza.
“Só vendemos animais de cativeiro. Todos os animais que estão aqui pertencem à União, ou seja, a qualquer brasileiro. São as matrizes: animais que vieram de zoológico, de apreensão, tudo o que chega para a gente das mãos do Ibama é matriz e não pode ser vendida. O que nasce dessas matrizes, a gente pode vender como animal doméstico”, explica. Quem quiser ter um destes em casa deverá desembolsar no mínimo R$ 2 mil.
Futuro
Quando o empresário Moacyr Carvalho Dias não puder mais cuidar de suas aves, já é certo que o criadouro ficará sob responsabilidade dos filhos e netos. Uma de suas netas, Letícia Carvalho Dias, já trabalha no viveiro e é responsável pelo gerenciamento do criadouro.
Maurício Carvalho Dias, filho do empresário, também auxilia nos trabalhos. “O Moacyr está muito feliz pelo empenho da família na direção do criadouro, juntamente com ele, e sabe que o futuro é cada vez mais brilhante”, finaliza Alexandre.
O Criadouro é aberto à visitação pública?
ResponderExcluirQual o endereço?
E aberto pra visitação??
ResponderExcluir